(ORIGINALMENTE PUBLICADO EM 11 DE ABRIL DE 2015 A foto que abre este texto foi atualizada com a republicação deste e o link original está aqui.)
Algo me leva a crer que amamos uma catraca nesse país. Eu não posso dizer como esse tipo de relacionamento se dá em outros países do mundo mas as coisas por aqui precisam de uma portaria, de uma catraca, roleta, algo que obstrua a passagem, mesmo que não seja para chegar a lugar nenhum.
Talvez seja nosso espírito burocrático, alguns dirão que é coisa do ranço da casa grande e da senzala, que é mais uma coisa de impedir o acesso ao povo e tudo mais. Não sei, não é como a história do elevador de serviço ou do banheiro de empregada que perdurou por anos e anos no cerne de nossa cultura, é algo maior, diferente. Não me refiro aqui aos bloqueios que existem nos meios públicos de transporte, cinemas ou semelhantes, estas são outras catracas que cabem num outro post futuro.
São as catracas sem fundamento, que existem porque alguém achou que deviam existir. São as catracas burras, ou mais burras. Na verdade toda burocracia é burra mas há situações que passam dos limites. São catracas que não servem de controle de acesso, não são úteis para garantir a segurança, para direcionarem o público, são úteis para absolutamente nada.
Recentemente fui buscar um documento para um cliente num escritório da SABESP e passei mais tempo passando meus dados ao profissional da catraca do que de fato pegando o documento que eu precisava. Informe meu RG, meu nome, o setor aonde iria, me perguntaram com quem eu iria falar e eu respondi claramente que não sabia o nome da pessoa que ficava atrás do balcão, passei quase 10 minutos me explicando e fui liberado. Entrei, solicitei o documento em nome do meu cliente e nenhum documento que comprovasse o meu direito por procuração de ter acesso àqueles dados me foi solicitado. Em menos de 5 minutos recebi o solicitado e apenas rabisquei algo que poderia ser uma assinatura de qualquer pessoa. Ao sair me perguntei: Por que tantas informações exigidas na entrada se não há a menor correlação como o que eu fiz de fato?
Ainda nessa semana fui visitar meu pai no hospital, fiz meu cadastro para ir até a UTI em que ele se encontrava e ao chegar lá me barraram a entrada. Faltava mais um crachá. Tive de descer até um outro piso e solicitar um segundo crachá. Senti-me como visitando um centro de pesquisas espaciais, algo militar, secreto. Meu pouco tempo de visita permitida estava sendo tomado por uma burocracia. Se ao efetuar o cadastro na recepção por que não me fora dado então os dois crachás? Eu sou mais jovem que minha mãe, ela tem o dobro da minha idade e teve de fazer o mesmo percurso, caminhar este mesmo tanto por qual razão? Segurança? Acho que não.
Dois dias depois meu pai estava sendo transferido da UTI para o leito e, teoricamente, eu que o acompanhava deveria trocar os crachás na recepção como me orientaram. Não o fiz, por pura e simples compreensão de que aquilo era idiotice. Sem crachá nenhum saí de uma ala e fui para outra enquanto meu pai era transferido. Fui embora e quase levei os outros crachás no bolso mas, por conta das coisas que meu pai me ensinou, entreguei as identificações na saída. Fui embora com a mesma ideia. Pra que tanto crachá, tanta pergunta, tanto controle que não serve pra nada? Um hospital tem de ter seu acesso vigiado, seguro? Sim, mas não de uma forma idiota.
São inúmeros os lugares que nos pedem o número do RG, CPF, data de nascimento e até mesmo título de eleitor. Qual o sentido disso? Fornecemos passivamente, nos sujeitamos aos bloqueios e muitas vezes nem nos perguntamos qual a serventia deles e, vez ou outra, quando estamos na posição de dentro, achamos que faltam bloqueios, controles.
Não por acaso visitei uma empresa no Rio de Janeiro esta semana e eles estão numa séria crise financeira, clientes inadimplentes, queda nas vendas e outras coisas mais. Estão passando por uma restruturação e, conversando com um dos responsáveis ele me disse uma das novas medidas que irão tomar agora: estão instalando catracas eletrônicas para controlar os acessos dos funcionários.
Talvez esteja aí a explicação.